Diz Pedro, mui judiciosamente, em sua 2ª Epistola (1:20), que "nenhuma profecia da escritura provém de particular elucidação". Emmanuel esclarece o óbvio, ensinando que isto significa que não podemos, nem devemos, nós, as criaturas humanas, interpretar a "revelação" a nosso belprazer, de acordo com nosso ponto-de-vista, submetendo-a a um leito-de-Procusto, "ajeitando-a" a nosso raciocínio. O critério a se aplicar, em matéria de interpretação escriturística, é em primeiro lugar e acima de tudo, o do bom-senso.
Como não existem duas espécies de bom-senso, segue-se que, através dele, chegaremos à verdade. Acodem-nos tais considerações, quando se nos deparam passagens evangélicas cuja interpretação poderá levar-nos a incoerências, contradições e até a absurdos doutrinários - se não pusermos o bom-senso para funcionar. (É claro que não particularizamos os EVANGELHOS: - A Bíblia, como um todo, obedece ao mesmo critério.)
Analisemos, por alto, algumas dessas passagens, por exemplo, que atribuem, ou insinuam, a "humanidade" de JESUS, ou seja: - Passagens que, interpretadas, de um modo "particular", poderiam levar a crer que o CRISTO foi um "ser humano", como nós-outros.
Em João(2:4), nas "Bodas de Caná", dirigindo-se a Maria, diz ele: "- Mulher, que tenho eu contigo?", ora palavras tais, na boca daquele mesmo que nos ensinou a honrar pai e mãe, parece-nos, no mínimo, estranhas. Deixarão de sê-lo, entretanto, se as "interpretarmos", como significativas de que Maria, naquele instante, estava "interferindo", em função de seu livre-arbítrio, na obra dele - tanto que replica: - "Ainda não é chegada minha hora" - o que corrobora nossa "interpretação". Ainda em João (4:32), respondendo ao discípulos, que lhe rogavam comesse, disse Jesus: "- Uma comida tenho para comer que vós não conheceis. A minha comida consiste em fazer a vontade daquele que me enviou" - v.34). Estranhas palavras, em verdade, se imaginarmos que o Cristo queria dizer, assim falando, que ele se alimentava de modo diferente dos outros homens. No entanto, se compreendermos que ele insinuava que tinha necessidade de alimentação material, como a nossa - porque diversa da nossa era a sua constituição - as coisas ficam claras.
Em Lucas (1:26/35), tem-se, segundo nossa "interpretação", a mais evidente comprovação da "não-humanidade" de Jesus! Maria "desposada" de José, é visitada por um anjo que lhe informa que "conceberá e dará à luz um filho"; perplexa com a insólita notícia, inquire a virgem: - " Como será isto pois não conheço varão algum?" E o anjo lhe responde: - "Descerá sobre ti o espírito-santo, e o poder do ALTÍSSIMO te envolverá com a SUA SOMBRA". E Maria engravidou, dando à luz seu filho (Lucas 2:5/7).
Concluímos, face ao que foi exposto, que a gestação e o parto de Maria foram fenômenos inabituais, aqui na Terra, uma vez que, em mundos elevados são fenômenos habituais. Quando os espíritos superiores responderam a Allan Kardec, em "O Livro dos Espíritos", pergunta nº 200, que os espíritos não têm sexo, "como o entendemos", estavam dizendo, implicitamente, que eles, os espíritos, possuem um processo de geração diverso do nosso, aqui da Terra. A "geração" de Jesus se processou dessa forma. Por isso, a denominamos "inabitual".
Ainda em Lucas, (5:1/11), mais um fato que evidência a "não-humanidade" do Cristo. Os discípulos exaustos e frustrados retornavam a terra, pois haviam "passado toda a noite trabalhando e nada haviam apanhado", segundo testemunho de Simão Pedro. Jesus ordena-lhes lançar as redes "ao largo", eis que os desenganados pescadores apanharam tamanha quantidade de peixes que suas redes se rompiam; em João (21:11), acontece fato semelhante, Jesus já ressuscitado orienta quanto ao local onde os discípulos deveriam lançar as redes, novamente é tamanha a quantidade, neste caso 153 grandes peixes, que até falta-lhes forças para recolher as redes ao barco. Tal fenômeno espírita é denominado dupla-vista, isto é, a visão além dos limites normais da mesma, em Jesus era natural, espontâneo - como aliás, todas as demais faculdades psíquicas, em decorrência de sua natureza de elevadíssima pureza.
Em Marcos (6:45/52)), outro fato surpreende, que induz à "não-humanidade" de Jesus: - Determina ele que os discípulos entrem no barco, e se dirige para os lados de Betsaida; tarde da noite, observando que eles se achavam em dificuldades, pois contrários eram os ventos, eis que se dirige para eles, caminhando sobre o mar!... O fato era realmente insólito, a ponto dos discípulos julgarem estar vendo um fantasma...Jesus acalma-os, sobe para o barco e, coisa estranha! cessa o vento e o mar se torna plácido...Mateus, (14:28/31), acrescenta um pormenor, que assinala, para quem tem "olhos de ver", a diversidade da natureza corporal, entre o CRISTO e o discípulo Pedro, ao narrar que este pede ao Mestre que o mande também "caminhar sobre as águas", e ao fazê-lo, dentro em pouco soçobraria, não fora o pronto amparo de Jesus, que o admoesta, numa lição que, em verdade, é para todos nós: -" Homem de pequena fé, por que duvidaste? Sabemos que o fenômeno físico, denominado "levitação", explica satisfatoriamente este evento.
dada a natureza "não-humana" de Jesus, no entanto, a sutileza de seu corpo esclarece-nos o que muita gente, inclusive os próprios discípulos, faz pensar em milagres e fantasmas...
Como poderia proceder de outro modo, um ser que viera a este mundo, "gerado pelo espírito-santo, e envolvido pelo poder do ALTÍSSIMO"?
JOEL ALVES DE OLIVEIRA
ARTIGO PUBLICADO ORIGINALMENTE NO PERIÓDICO " O 3 DE OUTUBRO", Nº 41 DE JANEIRO DE 2005.