A Queda do Espírito
A simbologia das Escrituras tem sido, através dos tempos, uma causa constante de sectarismo religioso. As Interpretações são diversas: teólogos, estudiosos ou simples comentadores; esquecidos, daquela salutar advertência de Pedro (II 1:20), de que “Nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação”. A estas alturas, o que deverá prevalecer? Qual a interpretação mais correta? Evidentemente aquela que for mais consentânea com o ensino do Cristo! E, aqui, lembra-nos novamente o evangelho, quando João (14:26) coloca na boca de Jesus estas palavras premonitórias: “(...) aquele consolador vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito”, lembrar?! Por que lembrar? Certamente porque o Cristo antevia, no tempo e no espaço, as deturpações que os homens haveriam de inserir no contexto do seu ensino, movidos pelos mais diversificados motivos — basicamente, pela falsa-interpretação.
Na atualidade, como resultado imediato das descobertas arqueológicas, aprofundados estudos à base de avançada tecnologia, muita coisa tem vindo à tona, permitindo aos competentes na matéria, restaurar, completar e reproduzir o que a poeira dos séculos e milênios trazia soterrada.
Outro tanto ocorre, e com mérito muitíssimo maior, no setor da exegese(1) e da hermenêutica(2) religiosas! Os símbolos vêm caindo paulatina e inexoravelmente, ante o rolo-compressor do progresso! A ciência avança, as mentes se iluminam! Não há mais fogueiras a temer, nem tribunais tenebrosos a sufocar na garganta a voz dos que querem gritar! A “Candeia” está, há mais de um século, colocada sobre o velador, só não se empapam de luz, se assim nos podemos expressar, aqueles que não o querem!
O espiritismo ensina. O espírito é criado simples e ignorante. Realiza seu processo evolutivo, no meio que lhe é próprio, isto é, na espiritualidade. Lá é “o seu mundo normal e primitivo”, ele jornadeia pelos mundos ou na condição de espírito decaído, isto é, cujo tônus vibratório defasado o tornou incompatível com o meio em que vivia, ou na condição de missionário. Mesmo nesta última condição, há que considerar o fato de que, mesmo o missionário, corporificando-se, submete-se a um processo de catarse, uma vez que, bem cumprida sua missão, ele galga escalões de progresso. Ninguém é suficientemente puro que esteja isento de progredir mais! Pelo menos na faixa da evolução intelectual.
Na obra “Os Quatro Evangelhos”, compilada por Jean-Baptiste Roustaing, e propagada pela Federação Espírita Brasileira, está dito que: “O Cristo de nossos dias não é mais o Cristo de Belém de Judá” — evolutivamente falando, é obvio. Tal afirmativa poderá até figurar como sacrílega ou blasfema. Acontece que os espíritos não cogitam absolutamente de agradar ou desagradar, a opinião de quem quer que seja — senão de revelar tudo aquilo que se enquadre no rígido racionalismo da doutrina que revelaram. O magno problema teológico da “queda do espírito” está embutido no belo símbolo do tradicional “pecado original”, belo, quanto ao aspecto do simbolismo, é claro. Triste, no entanto, se considerarmos que esse original-pecado é, em realidade, “tirando da letra que mata o espírito que vivifica”, o karma, ou seja: a bagagem dos débitos do passado e nunca débito de outrem (um hipotético e mal-digerido Adão).
“A cada um segundo suas obras” é o mandamento do Cristo. “O espírito será punido naquilo que pecou” é postulado do espiritismo. Para os espíritas, não será necessário assinalar que, no tema: “queda do espírito” está umbilicalmente ligada à reencarnação. Pela simples razão de que só ela explica o que, sem ela, ficaria por explicar. A não ser que se apele para supostos “desígnios divinos”, mistério, etc. Mas isso é outra conversa.
Joel Alves de Oliveira
Barra Mansa – RJ, 20 de Janeiro de 1998.
(1) S.f. 1) comentário ou dissertação para esclarecimento ou minuciosa interpretação de um texto ou de uma palavra. Aplica-se de modo especial em relação à Bíblia.
(2) S.f. 1) Interpretação do sentido das palavras. 2) Interpretação dos textos sagrados.
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